Foto do acervo de Monsieur Rouen.
Crônica da Cora Rónai:
"Na semana passada enfrentei, pela
enésima vez, os transtornos da ‘liberdade de expressão’ online. Uma ameba
sociopata desandou a escrever bobagens ofensivas na área de comentários do meu
fotolog, literalmente bloqueando o acesso às fotos.
Resultado: além de perder tempo
apagando aquelas porcarias, tive que restringir a área de comentários a pessoas
autorizadas, ou seja, as que já estavam na lista de favoritos. Novos visitantes
precisam, agora, me enviar um email para que eu os inclua.
Uma pena, porque, diante dessa
barreira, muita gente desiste. Digo por experiência própria, porque eu mesma já
deixei de comentar várias fotos de que gostei em fotologs de colegas por causa
disso.
Por outro lado, sob esse aspecto,
o Fotolog funciona bem melhor do que os sistemas de comentários dos blogs, que
ainda não criaram sistemas eficientes para deter ciber-vândalos, e precisam ser
vigiados e ‘capinados’ constantemente.
***
À medida em que mais e mais
pessoas começam a ter blogs e fotologs, o problema passa a ser cada vez mais
comum. Há alguns anos, decidir quais opiniões de leitores iriam ou não ao ar
era atribuição dos editores das seções de cartas dos jornais, que se baseiam em
normas claramente identificadas e em anos de traquejo e bom-senso.
Com a internet, e suas múltiplas
opções de palpite, essa difícil atividade passou à esfera da decisão individual
e, freqüentemente, solitária: ao contrário dos editores, que sempre têm com
quem discutir casos complicados, blogueiros e fotologueiros trabalham em geral
sozinhos - e muita gente ainda está meio perdida em relação ao assunto. Afinal,
a liberdade de expressão é cara a todos nós (ou, pelo menos, à maioria) e
apagar uma mensagem pode, efetivamente, representar um gesto de censura.
Ao mesmo tempo, críticas às vezes
são difíceis de aceitar. Se mesmo o couro de rinoceronte que adquiri em tanto
tempo de jornalismo não me torna imune a palavras duras, que defesa imunológica
terá o blogueiro ou fotologueiro que se depara, pela primeira vez, com opiniões
pouco favoráveis? Como agir diante da pluralidade de opiniões com que nos
confrontamos no cotidiano da rede?
***
Nos primeiros tempos do blog, eu
ficava muito perturbada quando tirava algo do ar. Aos poucos - mas realmente
aos poucos, e depois de muito bater cabeça com outros autores de blogs - fui me
convencendo de que há uma linha entre crítica e ofensa. Nem sempre ela é clara,
mas existe, e deve ser ela o parâmetro para o que fica ou o que não fica na
área de comentários.
Opiniões dissonantes não são
necessariamente ofensivas; já xingamentos, agressões gratuitas, provocações e
palavrões não são, definitivamente, críticas que se devam ser respeitadas. As
primeiras conduzem ao diálogo; as segundas, à destruição do meio-ambiente, já
que blogs e fotologs são ecossistemas delicados.
Suas áreas de comentários são
botequins virtuais onde, frequentemente, as mesmas pessoas se reúnem, todos os
dias, para trocar dois dedos de prosa. Às vezes sai uma briga. É normal. Mas às
vezes entra um pitboy pela porta adentro, quebra móveis e garrafas, agride os
habitués. Aí já não há nada de normal. A freguesia estranha, fica infeliz, vai
embora - e o point vai pro brejo.
Já vi bons e valiosos blogs
morrerem por causa disso, e gente de bem sofrer, sinceramente, por causa de
pedradas virtuais de vagabundos - quase sempre anônimos. É impressionante,
aliás, constatar como as pessoas mais agressivas são, invariavelmente, as mais
covardes. É tão fácil manifestar opiniões radicais no anonimato! Tão fácil
investir contra o mundo por trás da proteção de uma tela! Não por acaso, o
Slashdot, respeitado blog de nerds, atribui a alcunha de ‘Covarde anônimo’ a
quem entra sem se registrar.
***
Hoje já há certo consenso entre as
várias comunidades online que freqüento: democracia é bom, desde que mantidas
as regras básicas da boa convivência. Demarcar a linha entre crítica e ofensa é
difícil, mas não impossível; é este equilíbrio que quem mantém um blog ou um
fotolog deve procurar.
Comentários idiotas, mas não
ofensivos, devem, de preferência, ser ignorados. Apagar um comentário não deixa
de ser uma forma de resposta, e a regra de ouro para a grande mesa de botequim
da comunicação, virtual ou não, já foi estabelecida há tempos pelo Millôr: ‘Não
se amplia a voz dos idiotas’.
Importante também é não se deixar
pressionar pela gritaria das antas que, deletadas, gritam em nome da
‘democracia’ ou da ‘liberdade de expressão’. Balela.
A maravilha da rede é que,
se eu não estou contente com o que você está diz aqui, posso muito bem abrir um
blog ali adiante para contestar as suas palavras. Isso é democracia e liberdade
de expressão; entrar num blog ou num flog para xingar e fazer pipi no tapete é
falta de educação, grosseria, vandalismo."
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