Houve uma época em que o transporte transatlântico de passageiros era feito, principalmente, por grandes navios.
Na foto vemos meu pai a bordo do "Anna C", em viagem de lua-de-mel para a Europa. O "Anna C" foi lançado ao mar em 1948 e foi um dos famosos navios da "Linea C".Em 1968, quando a Rainha Elizabeth visitou o Rio, ficou hospedada no "Britannia", famoso iate inglês.Acervo Rouen: Estamos em 1973, numa das poucas visitas que o Transatlântico ‘FRANCE’ fez por aqui.
Na ocasião a imprensa publicava esta sua foto com o Pão de Açúcar ao fundo e noticiava: “Novamente na Guanabara o maior, mais belo e mais veloz navio do mundo."
Ele era tão grande que teve que ficar ancorado no meio da Baia da Guanabara.
O "France" teve o inicio de sua construção em 1957, indo ao mar em 1962 e navegando com este nome e bandeira até 1974, quando foi parado por questões econômicas.
O "Normandie" foi outro navio que fez várias viagens ao Rio. Teve um triste fim, vítima de incêndio em Nova York, durante a 2ª Guerra Mundial, quando estava sendo transformado em navio-hospital.
Foto colorizada pelo Nickolas mostra o "Normandie" no Rio. Seu interior era em art-déco.
O "S.S. Brazil" foi construído por volta de 1955 pela Moore-McCormack. Entrando em serviço em 1958 sofreu a forte concorrência das viagens aéreas, então se tornando comuns.
Com o declínio das viagens regulares de navio, as embarcações passaram a ser construídas para cruzeiros, atendendo a outros requisitos (mais espaço para entretenimento e menos para transporte, menos velocidade).
Montei muitos aviões com os "kits" Revell, mas o S.S. Brazil foi o único navio que montei. Ficou bem bonito. Está aqui em casa em lugar tão escondido de Mme. D´, que não o achei hoje...
Vemos o navio português "Príncipe Perfeito", na Praça Mauá. Veio com 987 turistas para visita de dez dias, em agosto de 1965. Foi construído na Inglaterra por volta de 1960 pela "Swan Hunter and Richardson".Nesta viagem veio a doação, por parte de antigos alunos da Universidade de Lisboa, para a Universidade do Brasil, por conta das comemorações do IV Centenário do Rio. Tratava-se do primeiro retrato oficial de D. João VI.
No dia 6 de junho de 1958, estando o Navio Hidrográfico Sirius atracado no molhe da Ilha Fiscal, o Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira visitou o navio após sua chegada ao País.
O Presidente Juscelino foi um dos principais responsáveis pela aquisição do Sirius, o primeiro navio de grande porte construído e concebido para a atividade de hidrografia.
Na despedida, uma curiosidade, o Presidente observa a aeronave orgânica do Navio pousada no convôo e relata ao então Ministro da Marinha, Almirante de Esquadra Alves Câmara: “Almirante, nunca andei de helicóptero”. Então de forma improvisada JK deixa o Sirius de um maneira nada convencional, voando. Já no interior da aeronave o piloto, na época Capitão-Tenente (FN) Carlos Albuquerque e posteriormente promovido ao posto de Almirante de Esquadra na década de 80, quando exerceu o cargo de Comandante Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, pergunta para o Presidente: “ Para onde vamos Sr. Presidente?” e o Presidente Juscelino responde: “Vamos sobrevoar o Catete (Palácio do Catete). Tenho que começar a me despedir do Palácio”. Dois anos depois a capital era transferido para Brasília e a sede do poder executivo deixava de ser o Palácio do Catete.
Garimpagem de Antonio Modesto Junior.
OBS: O curioso é que pesquisando sobre o Sirius encontrei no “Correio da Manhã” uma notícia do dia anterior, 05/06/1958, dando conta que na véspera “o helicóptero do navio hidrográfico Sirius, ao regressar para bordo, perdeu a potência do motor nas proximidades da Ilha Fiscal. Os tripulantes, comandantes Wigando Engelke, Roberto M. Monerat eum sargento da guarnição do navio saíram nadando enquanto o helicóptero mergulhava lentamente. O helicóptero foi recuperado e levado a bordo do Sirius”
Terá sido o mesmo helicóptero que levou o presidente?
Felizmente tudo correu bem. O presidente recebeu honras militares, foi apresentado aos oficiais que servem na Diretoria de Hidrografia e Navegação, percorreu as dependências do Sirius e sobrevoou a cidade de helicóptero.
O Sirius foi o primeiro navio que a Marinha do Brasil fez construir especialmente para levantamentos hidrográficos. Passaria a constituir junto com outros de sua classe, o Canopus e com outros três menores que estavam em construção no Arsenal de Marinha, o Argus, o Orion e o Taurus, o novo grupo de navios que completariam o levantamento do extenso litoral do Brasil.
O Sirius tinha as seguintes características: deslocamento, 1875 ton; comprimento, 78,70m; boca, 12m; calado 3,70m; velocidade máxima, 15 nós; velocidade de cruzeiro, 11 nós; raio de ação, 8000 milhas; propulsão, 2 motores Diesel de 1350 HP. Dispunha de um helicóptero, três lanchas hidrográficas, uma lancha de desembarque e dois jipes. Estava equipado com agulha giroscópica, radar, loran, ecobatimentos e raydist.
O Sirius teve sua quilha batida em 13/12/1956, foi lançado ao mar em 30/07/1957 e incorporado à Marinha de Guerra em 17/01/1958. Saiu de Tóquio em 8 de fevereiro com destino ao Rio de Janeiro, escalando em Kobe, Honolulu, São Francisco,Acapulco, Balboa, Curaçau, Belém e Recife. Sua guarnição compunha-se de 86 homens.
Outro navio famoso no Rio foi o "San Martin", fotografado por William Nelson Huggins, bisavô do amigo Tumminelli. Encalhou na Praia de Copacabana, em março de 1918.
No verso da foto está escrito: “San Martin stranded at Rio de Janeiro in a dead calm night, carrying grains to the Allied Armies. Taking with a Graflex at 5 am- about sunrise – f4.5 1/10sec.(W Nelson Huggins – Rio de Janeiro)”
O San Martin era um navio francês que vinha de Buenos Aires e teria como destino final o porto de Sète (Cette na grafia de 1918) no Mediterrâneo. Levava um carregamento de milho para as tropas aliadas. Estávamos em fins da 1ª Guerra. O comandante do navio era o dinamarquês Keneldoin. No fim da madrugada de 18 de março, com mar calmo, o San Martin encalhou em Copacabana a mais ou menos 20 metros da Av. Atlântica.
Houve na época três hipóteses para o acidente:
O Capitão estava no leme, bêbado, e acabou perdendo o rumo indo parar na praia; o Capitão não conhecia bem a entrada do porto e confundiu as luzes do Morro da Babilônia com as do porto; o Capitão recebera uma quantia de milhares de marcos dos alemães para, propositalmente, encalhar o barco e perder a carga que era destinada aos aliados.
A segunda hipótese é a mais aceita. Mas curiosamente a tia-avó do Tumminelli, Edith Huggins, filha de William Nelson, contava que o pai sempre falava da embriaguez do capitão.
Durante dias o trabalho para a retirada do barco foi contínuo. Os rebocadores da Marinha do Brasil, “Laurindo Pitta”, “Audaz” e “Tenente Claudio”, e mais os rebocadores da Cia. Costeira, “Tito Brito” e “Standart” se revezavam na tentativa de desencalhe do San Martin, mas em vão.
Decidiram então retirar a carga de milho do navio para deixá-lo mais leve e tentar rebocá-lo na maré alta. A carga foi retirada (não toda. Muito milho ainda ficou nos porões do navio). A autoridade policial era responsável pela segurança dela que era depositada na areia, a pedido do Inspetor alfandegário Vossio Brigido, para salvaguardar os interesses do Fisco. Essa manobra para desencalhar o navio não adiantou nada.
O tempo foi passando, interesses de firmas seguradoras e marítimas em resgatar o navio e seu conteúdo foram se desenrolando e nada foi sendo feito de concreto. Enquanto isso o navio continuava encalhado na praia, o milho já apodrecido ia parar nas areias, levado pelo mar.
Certa vez a ressaca fortíssima, em maio ou abril, partiu o já fragilizado casco do San Martin fazendo com que o milho apodrecido, que ainda estava em seus porões, se espalhasse nas areias, e que o cheiro que estava relativamente “preso” no navio se espalhasse pelo ar, para desespero dos moradores de Copacabana.
Aí começava o apelo dos moradores de Copacabana às autoridades. Mas a nossa velha conhecida atitude dos órgãos públicos apareceu: o jogo de empurra. A Saúde Pública dizia nada poder fazer porque o navio estava sob a responsabilidade do Ministério da Marinha, que por sua vez nada podia fazer a respeito… e o fedor aumentava a cada dia.
A “Revista da Semana”, aproveitou em uma de suas edições para provocar a Cia. City Improvements (que era responsável pela coleta de esgoto do Rio). Com a grafia original:
“Está de pêsames a City Improvements. A cintura de ouro do campeonato de mao cheiro, que lhe pertencia indisputadamente, há muitos annos, foi-lhe arrebatada pelo veleiro San Martin (…) cuja carga apodrecida ao contato da água do mar espalha pela Av. Atlântica um cheiro nauseabundo. (…) A poderosa empresa ingleza considerava-se a monopolisadora do fedor no Rio. Ella, só ella, poderia espalhar pela cidade cheiros pestilenciaes. A concorrência que está lhe fazendo o San Martin, é, além do mais, illegal. Esse navio á vella não tem o direito de empestar a cidade. Esse direito cabe, legalmente, á City Improvements (…).”
E assim o tempo foi passando, o navio cada dia mais destruído pelo mar, pondo em risco os banhistas com seus destroços presos na areia e os que se soltavam do navio, como vigias, pedaços de madeira, etc. O jornal “A Noite” foi categórico em uma matéria que em certa passagem dizia assim: “Houve alvoroço, mas logo foi cercado da benevolência infinita de nossas autoridades públicas. Simularam inquéritos, procedimentos judiciaes (grafia da época), etc., e, dentro em pouco tudo jazia no esquecimento. Ninguém mais se lembrava da “esbórnia” do San Martin.”.
Em 1919, o que restou do navio seria dinamitado. Era a única solução. Mas pelo visto não foi… Os destroços do San Martin permaneceram na arrebentação por muitos anos. Em fins dos anos 60 a tão sonhada dinamitação do San Martin aconteceu. Durante os estudos de levantamento topográfico para a duplicação da Atlântica e a implantação do Interceptor Oceânico (sob o atual canteiro central), verificou-se que o que restou do San Martin estava bem no caminho do Interceptor. E assim um dia ele foi dinamitado. Certamente pedaços do que restou desta explosão estão hoje sob o canteiro central da Av. Atlântica.
Nunca ninguém foi responsabilizado pelo ocorrido. Nem o capitão, nem a empresa dona do San Martin, como também nunca foi conclusiva qualquer uma das três hipóteses do acidente.