sábado, 26 de outubro de 2024

DO FUNDO DO BAÚ: CARROS ESPORTIVOS (2)

    CARROS ESPORTIVOS NACIONAIS (2), por Helio Ribeiro

Esta postagem é continuação daquela de ontem.

 

1)      BRASINCA UIRAPURU

Fundada em setembro de 1949 pela Gil & Schüler, uma das maiores revendas Ford do interior de São Paulo, a Inca – Indústria Nacional de Carrocerias de Aço S/A foi a primeira firma do país a fabricar carrocerias metálicas para ônibus. Por volta de 1952, para não ser confundida com a Incar, pequena fábrica de carrocerias de madeira então existente, mudou de nome para Brasinca.

Embora não fosse a finalidade da Brasinca, ela resolveu apostar num veículo esportivo. Usando o chassis do Aero Willys, projetou um automóvel de duas portas, que batizou de Boulevard. Oferecido à Willys Overland, foi recusado de pronto. Mas a Brasinca insistiu e daí surgiu o projeto Uirapuru.

Lançado no Salão de Automóveis de 1964 com a sigla 4200 GT, projetado e construído por Rigoberto Soler, a produção teve início em março de 1965. Usava mecânica Chevrolet de caminhão, com motor de 4.217 cc, seis cilindros em linha, tripla carburação e 155 CV. Na época era o carro de série mais veloz do Brasil, atingindo 200 km/h. Foto abaixo.

A crise brasileira de meados dos anos 1960 forçou o abandono do projeto em 1966, após 50 unidades comercializadas. O projeto foi vendido para a STV – Sociedade Técnica de Veículos Ltda, de São Paulo, que o relançou com o nome Uirapuru. Várias alterações foram efetuadas, embora poucas na parte externa.

No V Salão do Automóvel foi lançada a raríssima versão conversível do carro, da qual só foram produzidas 3 unidades.

A produção almejada de 20 unidades mensais das três versões do Uirapuru jamais se concretizou e já em 1967 a empresa suspendeu a fabricação delas, após construídas 76 unidades no total, inclusive as da época da Brasinca.

 

2)      HOFSTETTER

Talvez o automóvel de estilo mais radical já fabricado até hoje no Brasil, o Hofstetter foi desenhado em 1973 na Suíça, pelo brasileiro de ascendência suíça Mário Richard Hofstetter, na época com apenas 16 anos de idade. O motor era um Cosworth Brian Hart, normalmente usado em Fórmula 1. As portas eram no estilo gaivota e os vidros fixos, de modo que o ar condicionado era ligado automaticamente quando se dava partida no motor. Foto abaixo.

Hofstetter inspirou-se nos moderníssimos carros-conceito italianos da época, em especial o Alfa Romeo Carabo e o Maserati Boomerang, projetado por Giugiaro para a Ital-Design. Abaixo vemos fotos desses dois carros: Carabo em cima e Boomerang embaixo.

Embora construído o primeiro protótipo em 1973, o segundo só foi completado em 1982, já no Brasil. Sua carroceria de fibra de vidro mal atingia 1,03 m de altura. A parte mecânica era uma mistura total: motor 1.6 do Passat, suspensão dianteira do Chevette, suspensão traseira McPherson do Passat, arrefecimento da Kombi diesel.

Apresentado no XIII Salão do Automóvel em 1984, a produção foi iniciada em meados de 1986, pela Hofstetter Indústria e Comércio de Veículos Ltda, com produção limitada prevista para 30 carros por ano. Até o final de 1987 haviam sido vendidas 13 unidades.

Abaixo uma vista do interior do modelo Turbo do Hofstetter.

Por volta de 1987 o fabricante passou a ser a Tecnodesign Mecânica, Indústria e Comércio Ltda e foi lançado o modelo Hofstetter Cortada, sobrenome do proprietário da firma.

O último exemplar de que se tem notícia estava à venda em 1993.

 

3)      VENTURA

A firma L’Automobile Distribuidora de Veículos Ltda, de São Paulo, foi fundada em 1975, com o objetivo de fabricar réplicas de carros históricos.

No XI Salão de Automóveis, em 1978, foi apresentado o Ventura, sobre plataforma VW Brasília com motor de Variant II.

Os faróis eram do Dodge Polara e as lanternas traseiras eram do Alfa Romeo 2300. O interior era rebuscado, com painel, console e túnel revestidos de couro. Os bancos eram reclináveis, de couro com veludo cotelê. Os alto-falantes eram acoplados aos encostos de cabeça. Havia itens pouco comuns à época: toca-fitas, ar condicionado, vidros elétricos e teto solar deslizante.

O modelo agradou inclusive a estrangeiros. Para atender à demanda, a fábrica se mudou para São Bernardo do Campo. Eram produzidas 60 unidades por mês.

Com a recessão da década de 1980, no ano de 1983 a L’Automobile se desfez. Sua sucessora foi a L’Auto Craft, que continuou a produzir o Ventura, nas suas instalações em Barra do Piraí.

 

4)      BIANCO

Ottorino (Tino) Bianco fundou em 1974 a Toni Bianco Competições, com oficina em Diadema. Era projetista e construtor de carros esportivos. Em 1976 lançou no X Salão do Automóvel o Bianco S, que teve grande aceitação e vendeu 180 unidades naquele salão. A carroceria era de plástico reforçado com fibra de vidro. A plataforma era a da VW Brasília, com motor de 1600 cc, dupla carburação e 65 CV de potência.

A firma não conseguiu dar conta da grande procura e a vendeu, mantendo o logotipo e a marca por mais três anos.

No XI Salão do Automóvel, em 1978, a nova fabricante lançou o Tarpan, adaptado para atender a normas de exportação. O modelo não foi bem aceito. Em 1983 a firma encerrou as atividades.

 

5)      AURORA

Em 1989 a firma Aurora Projetos Automobilísticos Ltda, de Valinhos (SP) projetou um automóvel fora-de-série inspirado nos GTs Ferrari e Porsche. Concebido por Oduvaldo Barranco, auxiliado por dois projetistas de carros de competição argentinos, o carro foi apresentado no XVI Salão do Automóvel, em 1990, ainda sob a forma de maquete, e no salão seguinte, em 1992, já na forma definitiva. O projeto era ambicioso e a construção complexa. O motor era o 2.0 do Monza, com cilindrada aumentada para 2184 cc e equipado com turbocompressor Garret, elevando a potência para 214 CV. O modelo atingia 205 km/h e acelerava de 0 a 100 km/h em menos de nove segundos, superando todos os modelos nacionais em aceleração e velocidade máxima.


Por azar, a empresa lançou o carro justamente quando o governo Collor liberou as importações. Somente três unidades foram vendidas. A firma fechou em 1993.

 

6)      SANTA MATILDE

A Companhia Industrial Santa Matilde é uma firma muito antiga, fundada em 1916, com objetivo de explorar manganês na área de Conselheiro Lafaiete. Em 1926 entrou no ramo ferroviário, reformando e fazendo manutenção de vagões. Em 1946 passou a fabricá-los. Em 1968 ingressou no ramo de máquinas agrícolas, tendo grande sucesso durante anos.

Mas foi a partir de 1975 que a Santa Matilde resolveu construir carros esportivos, ao lançar o SM 4.1, com componentes mecânicos do Opala. O projeto foi de Ana Lídia Pimentel, filha do presidente da empresa, tendo como responsável pela construção do protótipo o piloto Renato Peixoto.

O carro foi apresentado na Expo-77 e lançado oficialmente no XI Salão do Automóvel. A imprensa especializada se dividiu: parte elogiou o carro, parte o criticou.

Ao longo dos anos foram sendo lançados modelos ligeiramente diferentes. Abaixo, um SM ano 1984.

Um SM conversível.


Um SM 1992.

Um horrendo SM 1997, construído sob encomenda e supervisão do comprador.

Este foi o último modelo fabricado. Em 2005 a Santa Matilde entrou em falência.

 

------  FIM  DA  POSTAGEM -----

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

DO FUNDO DO BAÚ: CARROS ESPORTIVOS (1)

 


CARROS ESPORTIVOS NACIONAIS (1), por Helio Ribeiro

OBS: Nesta postagem estou metendo o bedelho no que não conheço nem nunca me interessei em conhecer. Por isso tive de me basear exclusivamente no que obtive na Internet, sem nenhuma adição de minha autoria. Deixo a cargo dos conhecedores e interessados acrescentarem tudo o que considerarem conveniente para ilustrar mais a postagem.

A postagem de hoje é sobre carros esportivos genuinamente nacionais. Até a década de 1990 a importação de veículos era problemática, por isso a indústria nacional se esforçou em atender a uma demanda de carros esportivos. Após a liberação das importações, nenhuma dessas indústrias sobreviveu. Por esta razão os carros aqui mostrados são considerados peças de colecionador e alguns alcançam preços elevados no mercado especializado nesse segmento de veículos.

Vários desses modelos eu nunca vi, nem circulando nas ruas nem em exposições de carros antigos. Alguns fabricantes criaram vários modelos e seria extenso postá-los ou dissertar sobre eles aqui. Por isso apenas um ou outro modelo foi selecionado para a postagem.

Da mesma forma, a história de cada fabricante é muito extensa e foi extremamente condensada.

 

1)  FARUS ML 929

A Farus Indústria de Veículos Esportivos Ltda foi uma indústria de Belo Horizonte fundada em 1979 por pai e filho, Alfio e Giuseppe Russo, daí o nome Farus, resultante da fusão das palavras Família Russo. Na verdade, o projeto do primeiro carro foi iniciado em 1977, quando pai e filho eram donos da Italmecânica, fábrica de equipamentos para a indústria alimentícia.

Em junho de 1980 foi lançado o primeiro modelo, o Farus ML 929. A mecânica era do Fiat Rallye (motor 1.3 de 72 CV e caixa de quatro marchas). As lanternas traseiras eram do Ford Corcel II.

No final de 1984 foi apresentado o Farus Beta, nas versões conversível e coupé, agora com conjunto motriz do Monza 1.8 (motor de 96 CV a álcool e 83 CV a gasolina) e caixa automática ou manual de quatro ou cinco marchas.


Em 1989 a Farus lançou o Quadro, com várias novidades em relação ao modelo anterior.

Em 1990 a Farus foi vendida para a indústria paulista Tecvan – Tecnologia de Vanguarda Ltda, que não sobreviveu às importações liberadas e fechou as portas em 1991.

 

2)      PUMA


A Puma foi a realização do sonho de um italiano naturalizado brasileiro, Genaro “Rino” Malzoni, de criar um veículo com proposta esportiva, usando carroceria de fibra de vidro montada sobre a plataforma de um carro de passeio. O protótipo foi desenvolvido na sua fazenda em Matão, interior de São Paulo, usando chassis e mecânica DKW Vemag, motor de 3 cilindros e 981 cm³ e peso de 720kg. Os responsáveis pelo protótipo foram Jorge Lettry (departamento de competições da Vemag), Rino Malzoni e Anísio Campos (designer e piloto). Esse protótipo venceu cinco corridas em Interlagos em 1964 e várias outras no ano seguinte.

O sucesso deu origem em 25 de agosto de 1963 à Sociedade de Automóveis Lumimari Ltda, nome derivado das iniciais de seus fundadores: Luis Roberto Alves da Costa, Milton Masteguin, Mário César de Camargo Filho e Rino Malzoni. O primeiro modelo foi batizado de GT Malzoni e estima-se que apenas 35 unidades foram fabricadas, entre 1964 e 1966. Foto abaixo.

Em 1966, por sugestão de Jorge Lettry, a empresa foi rebatizada como Puma Veículos e Motores e o GT Malzoni relançado como Puma GT em 1967. Estima-se que foram produzidas 125 unidades.

No mesmo ano de 1967 a Vemag foi comprada pela Volkswagen e a Puma passou a usar a plataforma do Karmann Ghia 1500 no lugar do DKW Vemag. O resultado foi o lançamento do Puma GT VW em 1969. Foto abaixo.

A partir daí, foram tantos os diferentes modelos de Puma lançados que daria uma postagem só para eles. Paramos por aqui, destacando apenas o Puma GTB 1974, com mecânica do Opala 4.1.

Em 1979 morreu Rino Malzoni. Em 1986 a Puma deixou de existir na prática.

 

3)      WILLYS INTERLAGOS

O Willys Interlagos foi produzido de 1962 a 1966, sendo considerado por alguns o primeiro carro esportivo nacional. Era a versão brasileira do Renault Alpine A108. Foi produzido em três versões: berlineta, conversível e coupé. Fotos de duas delas abaixo.


A título de comparação, abaixo o Renault Alpine A108.

 

4)      LOBINI

A Lobini foi uma fabricante brasileira de automóveis fundada em 1999. O nome é composição de José Orlando Lobo e Fábio Birolini. Tinha sede em Cotia (SP). Em 2006 o controle da empresa foi passado para Antônio Ermírio de Moraes Filho e foi fundada a Brax Automóveis, ficando os antigos proprietários da Lobini como diretores. Seu único modelo de carro lançado foi o Lobini H1, motor de 1.8 turbo derivado do Golf GTI, à venda a partir de 2005. Era o mais veloz carro brasileiro, passando dos 220 km/h e acelerando de 0 a 100 km/h em apenas 6,3 segundos. Foto abaixo.

Estava previsto o lançamento do Lobini R porém a empresa fechou em 2012.

 

5)      MIURA

Miura era a marca dos carros esportivos produzidos pela empresa gaúcha Besson, Gobbi & Cia. Ltda, dos empresários Aldo Besson e Itelmar Gobbi. O primeiro carro da longa série que recebeu o nome Miura foi lançado em 1976, no X Salão de Automóveis. Usava plataforma da VW Brasília. Era baseado no Lamborghini Urraco e foi projetado por Nilo Laschuk, então ainda estudante de arquitetura em Caxias do Sul. Foto abaixo.

Desde o início o Miura apresentava soluções técnicas e estéticas originais e modernas, algumas das quais só adotadas pelo mercado décadas depois.

Em 1979 foi apresentado o protótipo do Miura MTS, com motor Passat TS e o resto da mecânica ainda da VW Brasília.

Em novembro de 1981 foi lançado o Miura Targa, com teto rígido removível e motor dianteiro, mecânica Passat GTS. Motor 1,6 (76 CV a gasolina) ou 1,5 (65 CV a álcool).

Em 1985 for a vez do Miura Saga, o mais famoso da série. Foto abaixo.

Em 1987 foi a vez do Miura X8. Em 1990 foi lançado o último modelo da série, o X11. Na foto abaixo vemos na parte superior o X8 e na inferior o X11.

Em 1992, com a abertura do mercado para os carros importados, a produção do Miura foi encerrada.

      

-----  AMANHà TEM  MAIS  -----

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

A GAIOLA DE OURO

 

FOTO 1: Vemos o Conselho Municipal. Situado no Largo da Mãe do Bispo, no encontro da Rua da Ajuda, Rua dos Barbonos (atual Rua Evaristo da Veiga) e Rua da Guarda Velha (atual Avenida 13 de Maio), em terras cedidas pelas freiras do vizinho Convento da Ajuda. 

Ali, em 1871, se construiu a Escola São José. Mais tarde instalou-se nesta construção o Conselho Municipal, em estilo manuelino, e foi nele que o Vereador José do Patrocínio, ainda semanas antes monarquista, proclamou a República logo após o golpe militar no Campo de Santana. 


FOTO 2: Em 1918 foi demolido o belo prédio do Conselho Municipal para a construção do novo prédio, que foi inaugurado em 1923 pelo prefeito Alaor Prata. Em 1937, com a implantação da ditadura do Estado Novo, a Câmara foi dissolvida. Somente em 1946 voltou a funcionar a Câmara dos Vereadores, com a redemocratização e a volta das eleições diretas. 

FOTO 3: Nesta foto de Malta da década de 20, com o fotógrafo nas escadarias do Municipal, podemos ver na Rua Evaristo da Veiga a torre da Igreja Anglicana. Na esquina, o poste com a sinalização de parada de bonde. Em primeiro plano o belo lampadário da calçada do Teatro Municipal.

FOTO 4: O novo edifício foi projeto do arquiteto Heitor de Mello e a construção teve início em 14 de dezembro de 1918. Com a morte dele em 1920, Archimedes Memória e Francisque Cuchet, do mesmo escritório de arquitetura, passam a liderar o projeto. As obras foram concluídas e o edifício inaugurado oficialmente em 21 de julho de 1923 com o nome de Palácio do Conselho Municipal.

FOTO 5: Esta foto, garimpada pelo Nickolas, já foi publicada e teve comentários de Obiscoitomolhado:  o conversível é um Buick 1941, conversível e de 4 portas, se não me engano o último ano em que foram fabricados com 4 portas. O Chevrolet de 2 portas é 1941 e o saia-e-blusa é 1946, ambos são Special Deluxe. O carro preto que está entre o pedestre e o bonde é um Chevrolet 1940 e, à frente, outro Chevrolet, 37-38. Finalmente, o furgão encoberto pelo poste, também Chevrolet pós-48. 



FOTO 6: Na época, a arquitetura e o custo alto das obras chamaram a atenção: 23 mil contos de réis, mais do que o dobro do valor gasto no Teatro Municipal (10 mil contos de réis). Isso contribuiu para que ganhasse o apelido pejorativo de “Gaiola de Ouro”.


FOTO 7: Foto do Arquivo Nacional, provavelmente do início dos anos 50.


FOTO 8: Em 1951 o palácio passou se chamar Pedro Ernesto.


FOTO 9: Foto de 1965, do Acervo do Arquivo Fotográfico da Light. Veem-se dois tipos de postes de iluminação: um, mais alto, com uma luminária (e refletores para iluminar as paredes do prédio) e outro, na calçada junto ao bar, com duas luminárias. No poste escuro, na praça, a caixa de ferro do telefone de um ponto de táxi. Quase no meio da foto o poste tipo "pirulito" indicando o nome das ruas.