POT-POURRI DE MARIAS, por Helio Ribeiro
Esta
postagem lista uma série de pessoas e personagens conhecidas por terem a
palavra "Maria" no seu nome, real ou não. Nenhum critério de escolha
foi adotado. A lista foi surgindo conforme eu ia me lembrando de quem a poderia
compor. As informações obtidas foram muito condensadas, para não alongar demais
a postagem, eis que todas as Marias possuem extensíssimo currículo.
1) ÂNGELA MARIA
Nascida
Abelim Maria da Cunha (13/05/1929 - 29/09/2018), celebrizou-se na chamada Era
do Rádio. Seu pai era pastor evangélico, e Ângela desde criança cantava no
coral de uma igreja Batista próxima de casa. Por volta de 1948 apresentou-se
várias vezes no programa de calouros Pescando
Estrelas, onde sempre tirava nota máxima. Depois foi cantar no Dancing Avenida e na Rádio Mayrink
Veiga. Em 1951 gravou seu primeiro disco e sua carreira deslanchou. Em 1954
gravou seu primeiro álbum de estúdio, A
Rainha Canta. Foto abaixo.
Um
dos seus primeiros sucessos foi a canção Babalu,
de autoria da compositora e cantora cubana Margarita Lecuona, composta no
início dos anos 1940. A letra é em espanhol. "Babalu-ayê", palavra
repetida várias vezes na letra, corresponde ao orixá Obaluaê.
Ângela
teve uma vida sofrida, mas aos cinquenta anos encontrou o amor na pessoa de Daniel
d'Ângelo, de dezoito anos, e com ele viveu até o fim de seus dias, em 2018.
2) MARIA BONITA
Maria
Gomes de Oliveira (17/01/1910 - 28/07/1938) foi uma cangaceira, companheira de Virgulino
Ferreira da Silva, o famoso Lampião.
Aos
15 anos casou-se com seu primo Zé de Neném, por arranjo familiar. O marido era
alcoólatra e adúltero contumaz e agredia constantemente Maria, quando ela
reclamava de suas infidelidades. Por vingança, passou a também trair o marido,
até que em 1929 conheceu e se apaixonou por Virgulino, quando então seu
casamento ruiu de vez, embora legalmente ainda fosse esposa de Neném.
No
mesmo ano, resolveu fugir de vez com Virgulino, entrando para o bando de
cangaceiros por ele chefiado, onde era conhecida como Maria da Déa (apelido de
sua mãe) ou Maria do Capitão.
Há
muito romantismo e ficção na história dos cangaceiros, pintados como Robin Hoods tropicais. Na verdade, eram
extremamente cruéis, matando, estuprando e roubando a população dos vilarejos
que invadiam. Abaixo, foto do bando de Lampião.
Maria
usava joias roubadas por Lampião e o
mesmo perfume francês que ele. Portava um revólver Colt .38" e um binóculo
alemão, com o qual espionava previamente as cidades a serem atacadas pelo
bando. Também portava um punhal de 32cm, feito de prata, marfim e ônix.
Em
1931 teve uma filha de Lampião, de
nome Expedita Gomes de Oliveira Ferreira, entregue a um casal de vaqueiros amigos
para ser criada. Foto atual de Expedita.
Na
manhã do dia 28/07/1938, enquanto se preparava para o desjejum, o bando foi
emboscado pela polícia armada oficial, conhecida como volante. Maria foi morta
a tiros e degolada por José Panta de Godoy, o mesmo que nela havia atirado. Lampião também teve o mesmo fim,
degolado.
O
apelido de Maria Bonita somente
surgiu após sua morte. A origem do mesmo é controversa.
3) MARIA ESTHER BUENO
Maria
Esther Andion Bueno (11/10/1939 - 08/06/2018) começou sua carreira esportiva
aos seis anos de idade, no Clube de Regatas Tietê, do qual era vizinha. Seu pai
queria que ela estudasse balé. Inicialmente disputou com sucessos algumas
provas de natação, na modalidade 50 metros livre, mas sua paixão era o tênis.
Aos
11 anos disputou seu primeiro campeonato de tênis; aos quatorze, venceu o
Campeonato Brasileiro Infantil e dois meses depois o Brasileiro de Adultos. Em
1955, aos dezesseis anos, conquistou em dupla a medalha de bronze nos Jogos
Pan-Americanos do México.
Entre
1956 e 1959 venceu cerca de 35 torneios, simples ou em dupla, em vários países.
Em
4 de julho de 1959 ganhou o primeiro título de simples num torneio do Grand
Slam, em Wimbledon, pondo fim a 21 anos de supremacia norte-americana naquele
gramado. Como preêmio, ganhou um voucher de 15 libras, para trocar por
munhequeira e meia, pois o torneio era amador. No mesmo ano venceu o atualmente
denominado US Open, sendo considerada a melhor tenista do mundo pela Federação
Internacional.
Em
1964, ao vencer a partida final do US Open em apenas 19 minutos, entrou para o
Guinness Book of Records.
Acostumada
a treinar com homens, Maria Esther adquiriu uma técnica diferente de jogar o
tênis feminino. A forma como "deslizava" na quadra lhe rendeu o
apelido de Bailarina do Tênis. Abaixo,
foto dela em ação.
Suas
vitórias foram tantas que não é possível enumerar aqui. Também teve vários
problemas de saúde: hepatite em 1961, contusão no joelho em 1965 e finalmente
epicondilite, também conhecida como cotovelo de tenista, por jogar durante mais
de 10 horas seguidas em partidas de duplas e duplas mistas em Wimbledon, em 1967.
Sua carreira brilhante teve uma interrupção em 1968.
Na
década de 1970 voltou a jogar, após uma longa série de cirurgias, porém já sem
o brilho de antes.
Em
1977 encerrou de vez a carreira.
No
ano seguinte teve seu nome incluído no exclusivíssimo International Tennis Hall of Fame, sendo a primeira sul-americana a
merecer essa honra. No mesmo ano teve sua estátua em cera inaugurada no famoso
museu de Madame Tussauds. Foi eleita a melhor tenista latino-americana do
Século XX por jornalistas do mundo todo.
4) MARIA THEREZA FONTELLA GOULART
Nasceu
em 23/08/1936, em São Borja, filha de imigrantes italianos. Era vizinha da casa
de João Goulart (Jango), tendo-o conhecido aos 14 anos de idade, mas não se
interessou por ele à primeira vista, eis que não imaginava poder ter algum
relacionamento com alguém tão importante. Somente após haver terminado seus
estudos começou a se relacionar afetivamente com Jango, então Ministro do
Trabalho.
Casaram-se
em 26/04/1955, quando Jango concorria a vice-presidente do país. Em 1956
tornou-se a mais jovem segunda-dama do Brasil, aos 19 anos de idade, ao ser
Jango eleito como vice de Juscelino Kubitschek e posteriormente de Jânio
Quadros.
Quando
Jango se tornou presidente, ela ficou sendo a mais jovem primeira-dama do país,
aos 25 anos de idade. Foi considerada pela revista People como uma das dez mais belas primeiras-damas do mundo, e pela
revista Time uma das nove Belezas Reinantes mundiais, ao lado de
Jacqueline Kennedy, Grace Kelly e Farah Diba.
Participou
ao lado do marido do famoso comício de 13/03/1964, um dos motivos deflagradores
do golpe militar que se seguiu semanas depois.
Após
a deposição de Jango, a família exilou-se no Uruguai e posteriormente na
Argentina, onde Jango morreu em 06/12/1976. Em 15/11/2008 ela e Jango receberam
anistia e ela passou a ter direito a um salário mensal correspondente ao de um
advogado sênior, pois Jango era bacharel em direito. Também recebeu valor
retroativo referente a esse salário e uma indenização por ter sido impedida de
voltar ao Brasil por quinze anos.
5) MARIA BETHÂNIA
Maria
Bethânia Viana Teles Veloso (18/06/1946), embora tenha várias habilidades
artísticas, é mais conhecida como cantora. Irmã do cantor e compositor Caetano
Veloso, teve seu nome escolhido por ele, baseado na valsa Maria Betânia, do compositor Capiba, grande sucesso na época na voz
de Francisco Alves.
Na
juventude participou de várias peças teatrais junto com Caetano Veloso. Seu
sonho era ser atriz. Em 1963 mudou-se para o Rio de Janeiro e foi convidada
pelo irmão para cantar algumas faixas da trilha musical da peça Boca de Ouro, de Nélson Rodrigues, sendo
este seu primeiro trabalho profissional com a música.
Em
13 de fevereiro de 1965 iniciou sua carreira musical ao substituir Nara Leão no
espetáculo Opinião. No mesmo ano
gravou seu primeiro álbum, de nome Maria
Bethânia. Algumas das músicas eram: Carcará,
Mora na Filosofia, Feitio de Oração. Foto abaixo.
Sua
discografia é muito extensa, com 34 álbuns gravados em estúdio, 22 ao vivo e dezenas
de participações em trilhas sonoras de filmes e novelas, além de colaborações
com outros artistas. Durante sua carreira vendeu mais de 26 milhões de álbuns,
sendo uma recordista no Brasil.
Na
maior parte das vezes apresenta-se com cabelos soltos, vestidos longos e
descalça. Já foi fruto de imitação por diversos comediantes, entre os quais Tom
Cavalcante.
Não
costuma dar entrevistas, exceto quando do lançamento de um álbum. Diz que sua
vida particular não interessa, pois o que ela tem a mostrar o faz no palco.
6) CAROLINA MARIA DE JESUS
Carolina
Maria de Jesus (14/03/1914 - 13/02/1977) nasceu numa comunidade rural de
Sacramento, interior de Minas Gerais, filha de pais analfabetos. Este texto é
extremamente resumido, eis que a vida de Carolina foi um nunca acabar de
sofrimentos, mudanças de moradia e altos e baixos financeiros.
Estudou
apenas até o segundo ano primário, o suficiente para aprender a ler e escrever,
tendo desenvolvido o gosto pela leitura.
Em
1937 sua mãe morreu e ela se mudou para São Paulo, onde construiu sua própria
casa com papelão, lata, madeira e o que mais pudesse encontrar. À noite saía
para catar papel e vender o resultado da coleta, para conseguir dinheiro.
Em
1947 mudou-se para a favela do Canindé e se empregou na casa do famoso médico
cardiologista Euryclides de Jesus Zerbini, aproveitando para ler os livros de
sua biblioteca nos dias de folga. Ao ter seu primeiro filho, em 1949, perdeu o
emprego e voltou a ser catadora.
Passou
a registrar, nos cadernos que encontrava jogados fora, o cotidiano da
comunidade onde morava. Eram mais de vinte cadernos. O conteúdo de um deles
originou o livro Quarto de Despejo:
Diário de uma Favelada. Foto abaixo.
Publicado
em 1960, a tiragem inicial de 10 mil exemplares se esgotou em uma semana. Desde
sua publicação, o livro foi editado em quatorze idiomas e vendeu mais de um
milhão de exemplares.
A
publicação do livro gerou a raiva e inveja dos vizinhos, que a acusaram de
expor suas vidas sem autorização. Chegaram a jogar nela e nos seus três filhos
o conteúdo de penicos.
Em
1961 foi lançado o disco Quarto de
Despejo: Carolina Maria de Jesus cantando suas composições, com músicas de
sua autoria. Foto abaixo.
Em
1962 e 1963 o livro foi publicado nos EUA por três editoras diferentes, sendo
que só de uma delas vendeu 300 mil exemplares, o que daria direito a que ela
recebesse mais de 150 mil dólares. Não existe registro de que ela tenha
recebido uma parte substancial disso, embora periodicamente lhe fossem pagos
alguns caraminguás a título de direitos autorais.
Após
a publicação do livro, Carolina e os filhos mudaram-se primeiro para Santana,
bairro de classe média em São Paulo, e depois para Parelheiros, onde
residências ricas eram vizinhas de casebres. Parou então de receber os direitos
autorais e ela e os filhos voltaram a catar garrafas e papéis. No terreno de
sua casa ela cultivava algumas verduras e vendia esses produtos a uma
comerciante local. Em Parelheiros sua vida era melhor do que no Canindé, porém
muito abaixo do mínimo decente.
Ao
longo da vida, além de coletar material pelas ruas e escrever livros, fez
faxina, lavou roupas para fora e deu aulas de alfabetização.
Morreu
de complicações de asma, doença que portava desde o nascimento.
7) MARIA LENK
Maria
Emma Hulga Lenk Zigler (15/01/1915 -
16/04/2007) começou a nadar aos 10 anos de idade, após uma pneumonia dupla,
pois seus pais acharam que a natação seria boa para ela. Por incrível que pareça,
praticava nas águas do Rio Tietê, na época ainda sem poluição.
Entre
1932 e 1935 venceu quatro vezes a tradicional Travessia de São Paulo a Nado.
Aos dezessete anos já era nadadora de nível internacional, tendo sido a
primeira mulher sul-americana a competir nos Jogos Olímpicos de 1932, em Los
Angeles. Ela e outros 68 atletas custearam a viagem vendendo o café que haviam
levado a bordo. Competiu com um uniforme emprestado, devolvido ao final das
provas.
Jamais
ganhou medalhas em Olimpíadas, porém é considerada pioneira da natação moderna,
ao introduzir o nado borboleta numa competição de nado de peito, realizada em 1936, em Berlim. nos Jogos
Olímpicos de Verão.
Quebrou
dois recordes mundiais em 1939, nos 200 e 400m nado de peito, nos jogos
preparativos para as Olimpíadas de Tóquio de 1940, que não foram realizadas em
virtude da eclosão da II Guerra Mundial.
Em
1942 ajudou a fundar a Escola Nacional de Educação Física da então Universidade
do Brasil, atual UFRJ.
Até
hoje ainda detém vários recordes mundiais de masters, tendo entrado para o International
Swimming Hall of Fame da Federação Internacional de Natação em 1988, quando
foi incluída nos Top Ten por ser um dos 10 melhores nadadores master do mundo.
Em
2000, no campeonato mundial da categoria 85-90 anos de idade, voltou de Munique
com cinco medalhas de ouro, sendo a vencedora nas categorias 100 metros peito,
200 metros livre, 200 metros costa, 200 metros medley e 400 metros livre.
Em
2007 a Prefeitura do Rio de Janeiro batizou de Maria Lenk o Parque Aquático
preparado para os Jogos Pan-Americanos daquele ano.
Em
20 de julho de 2002 foi considerada a Patrona da Natação Brasileira.
Até
o fim da vida nadava 1500 metros diariamente.
O "Saudades do Rio" mais uma vez agradece ao Helio pela brilhante colaboração.