FOLGUEDOS DE RUA
Esta postagem recorda
uma série de folguedos de criança que eram praticados na rua. Talvez muitos visitantes
da Zona Sul nunca tenham se divertido com eles, por motivos vários. Alguns dos
folguedos envolviam duplas, outros exigiam dois grupos rivais e outros mais
eram realizados por várias crianças, sem conotação de grupos.
As descrições e quando
aplicável as regras que citarei são as que nós adotávamos dentro da nossa
patota. Podem variar para outros grupos ou locais.
Não resisti a rememorar
o modo como brincávamos. São recordações pessoais, diferentes da impessoalidade
que se espera de uma postagem. Sorry.
Vamos aos folguedos.
1) AMARELINHA
Dispensa descrições.
Mesmo quem nunca brincou de amarelinha sabe do que se trata, ou assim penso. No
nosso caso, desenhávamos a amarelinha com giz e usávamos uma casca de banana
para indicar nossa progressão nos quadradinhos. Nossa marcação era diferente da
mostrada na foto: os quadradinhos 1, 2 e 3 eram em linha, depois vinham o 4 e 5
atravessados, o 6 novamente em linha e o 7 e 8 atravessados. Portanto, não
tínhamos 9 quadradinhos como aparece na foto. E onde está o 10 escrevíamos
"CÉU".
2) PELADA
Preciso descrever? A largura
das balizas era constituída pelo espaço entre uma árvore e a parede da casa em
frente. Não era pouco, pois a calçada da Dona Delfina era e ainda é bastante
larga levando em conta que éramos crianças ou pré-adolescentes. Não havia
travessão. Por consenso, se a bola passasse alta e fora do alcance do goleiro
considerávamos tiro de meta. As balizas eram em calçadas opostas, de modo que
para sair de uma e chegar à outra tínhamos de atravessar a rua com a bola.
Tradicionalmente uma baliza ficava em frente à minha casa, de número 46, e a
outra em frente à bonita casa de número 33, já demolida. De vez em quando a
bola caía no quintal da 35, que era um chalé suíço habitado por um almirante da
reserva, já bem velhinho. Ele era ranzinza e não gostava de devolver a bola.
Então pulávamos o baixo muro e a pegávamos de volta.
Às vezes entrava na rua
uma rádio-patrulha vinda do distrito policial situado na rua Conde de Bonfim.
Aí quem a visse dava o alarme "Lá vem a RP!" e todos sentávamos no meio-fio,
com a maior cara de pau e escondendo a bola.
Como não havia muitas
crianças da mesma faixa de na rua, para jogarmos pelada precisávamos da
presença de crianças de outras ruas. O craque da bola era o Marcos Elias, que
estudava no Colégio Militar e morava na rua Uruguai. Ele tinha um irmão que
chamávamos de Lulu da Palmerana, quando o correto seria Lulu da Pomerânia. Existe
um cão dessa raça, mas não sei o motivo do apelido do Lulu. Também bons de bola
eram os trigêmeos Luís, Ricardo e Manuel, filhos de um médico e moradores na
avenida Maracanã, esquina com a Dona Delfina e que de vez em quando saíam na
porrada entre si. E quem tentasse separar acabava apanhando, e dos três ao
mesmo tempo.
3) CHICOTINHO QUEIMADO
Não achei imagem condizente
com essa brincadeira na Internet.
Um objeto qualquer era
escolhido como o chicotinho queimado. Uma das crianças o escondia em algum
lugar, inclusive dentro do quintal ou na vegetação de alguma casa, enquanto as
demais fechavam os olhos. Uma vez escondido, as demais começavam a procurar o
chicotinho queimado. Aquela que o escondeu ia dando as dicas do tipo "Está
frio", ou "Está esquentando" ou "Está quente", para
indicar para cada criança se ela estava perto ou longe do lugar onde o
chicotinho estava escondido. Quem o achasse seria o próximo a escondê-lo.
4) PIQUE-BANDEIRA
Era jogado em dois
grupos, um contra o outro. Na calçada era traçada uma linha reta com giz, da
parede de uma casa até o meio-fio, delimitando dois campos. A determinada
distância dessa linha, cada grupo colocava no chão a sua bandeira, que poderia
ser um chinelo, um galho de árvore ou qualquer outro objeto. Cada grupo ficava
no seu campo. O objetivo era roubar a bandeira do outro grupo e trazê-la para
seu campo.
Enquanto um jogador
estivesse no seu próprio campo, ele não poderia ser molestado. Mas a partir do
momento em que entrasse no campo adversário, alguém do outro grupo corria atrás
dele para tocar no seu corpo. Isto feito, ele ficava congelado e só poderia se
movimentar novamente se alguém do seu próprio grupo o tocasse. Então era uma
correria geral, uns defendendo sua bandeira e congelando os adversários atrevidos
e outros tentando pegar a bandeira do grupo oponente. Haja suor e queima de
calorias!!
5) FRISBEE
Na nossa época não
havia esse tipo de objeto e o modo como brincávamos era diferente. Eram duas
crianças, cada uma se posicionando como goleiro nas balizas citadas no folguedo
PELADA, exceto que ambas as balizas eram na mesma calçada. A título de frisbee
usávamos tampinhas de cerveja ou uma tampa velha de panela. O objetivo era
fazer um gol no adversário.
6) PIQUE-ESCONDE
Jogado em grupo, sem
adversários. Uma criança, a procuradora, se posicionava em determinado lugar,
que era a sua base ou pique, e tapava os olhos, e as demais iam se esconder.
Nós usávamos como esconderijo os poucos carros estacionados ou entrávamos nos
quintais de algumas casas. A procuradora contava até determinado número, a
combinar (20 ou 30), enquanto as demais se escondiam. Terminada a contagem, ela
saía à cata dos escondidos após dizer bem alto "Lá vou eu!". Se um
dos escondidos saísse do seu esconderijo, corresse até o pique, o tocasse,
dissesse seu nome e "1, 2, 3" antes que a procuradora tocasse o mesmo
pique, estava salvo. Assim que a procuradora via um dos escondidos, dizia seu
nome, o local do esconderijo e voltava correndo para o pique, tocando-o e dizendo
"Pique 1, 2 3". Quem foi descoberto estava fora dessa rodada, a menos
que quando a procuradora disesse seu nome ele corresse e alcançasse o pique
antes dela. Se a procuradora conseguisse descobrir todos os escondidos, o
último deles passava a ser a nova procuradora. A estratégia era a procuradora
nunca se afastar muito do pique, para evitar que alguma criança o alcançasse
antes dela. Mas às vezes, para descobrir o esconderijo dos demais, ela era
obrigada a se afastar. Mas tinha de ficar de olho vivo. Caso a procuradora não
conseguisse descobrir ninguém, depois de certo tempo podia avisar que desistia
e então tudo recomeçava.
7) BOLA DE GUDE - TRIÂNGULO
Traçávamos um triângulo
a giz na calçada. Quem ia jogar combinava quantas bolinhas iria "casar",
colocando-as dentro do triângulo, e ficava com uma para tecar. Uma linha reta
era riscada a giz a determinada distância do triângulo. Cada jogador se
posicionava a determinada distância da linha reta e lançava a bola de tecar,
visando pará-la o mais próximo possível da linha. Depois que todos lançavam
suas bolas, determinava-se a ordem em que elas ficaram próximo à linha e esta
era a mesma ordem em que o seu jogador iria fazer seus lançamentos dali em
diante. Quando a bola de um jogador atingisse uma dentro do triângulo e esta
saísse fora, ele ficava com ela. Enquanto ele estivesse acertando uma bola,
continuava jogando. Quando errasse, era a vez do próximo. Caso a bola lançada
parasse dentro do triângulo, o jogador estava fora. E se ele tecasse a bola de tecar
de outro jogador, este estava fora. O jogo terminava quando não restassem mais
bolas dentro do triângulo.
8) PIQUE-COLA
Uma criança era escolhida
como a pegadora. Uma base também era escolhida: podia ser uma árvore, um poste,
o portão de uma casa, etc. As demais
crianças se afastavam e a pegadora saía atrás delas. Quem ela tocasse ficava
"colada" e só podia ser "descolada" pelo toque de outra.
Quem fosse "colada" três vezes passava a ser a nova pegadora.
9) BOLA DE GUDE - BÚRICA ou BÚLICA
Esse jogo exige chão de
terra, então só podíamos brincar disso na casa dos nossos vizinhos do número 44,
que tinham um filho e onde havia uma área de plantação. Mas eles eram muito
rigorosos quanto a estranhos, de modo que só permitiam a entrada do meu irmão,
de mim e de um colega bem mais novo, o Antônio José.
Antes de começar,
combinávamos se o jogo seria "à vera" ou "à brinca". No
primeiro caso, quem vencesse levava as bolinhas de gude dos outros; no segundo,
não.
A regra é um pouco
complicada: eram feitos três buracos (as búricas ou búlicas) na terra, com
determinado afastamento entre si. Estabelecida uma linha de partida, cada
jogador pegava sua bolinha e tentava jogá-la dentro da búrica mais afastada. Se
conseguisse, ele seria o primeiro a jogar dali para a frente. Se ninguém
conseguisse, a ordem de jogada era pela proximidade da tal búrica. A partir
daí, obedecendo a essa ordem de lançamento, cada jogador tentava colocar sua
bolinha dentro de cada búrica, seguindo a ordem delas no terreno: a mais
afastada, a do meio, a mais próxima, a do meio novamente, a mais afastada, a do
meio novamente. Quem fizesse esse roteiro estava na condição de
"mata". Em cada lançamento, o jogador podia optar por tentar colocar
a bola na próxima búrica ou tecar a do adversário para afastá-lo dela. Neste
caso, ou se conseguisse jogar a bola dentro da búrica, ele podia jogar
novamente. Caso um adversário estivesse com a bola dentro da búrica, os demais
não podiam jogar a sua ali dentro, tendo de fazer hora até ela sair de lá.
Quando um jogador atingisse a condição de "mata", sempre que tecasse uma
bola adversária ela saía do jogo.
No fim do jogo, o
destino de cada bolinha "matada" dependia do que havia sido combinado
no início: "à vera" ou "à brinca".
Antes do início de cada
rodada, quem primeiro gritasse
"Marraio!" seria o último a lançar sua bola, o que era
vantagem pois poderia tecar a dos adversário e afastá-las da búrica inicial e
não poderia ter sua bola afastada pelo mesmo motivo.
Quem gritasse
"Acompanha!" logo a seguir do "Marraio!" seria o penúltimo
a lançar; quem gritasse "Feridor sou rei!" a qualquer momento seria o
primeiro a começar o jogo se sua bola inicial atingisse qualquer uma das
demais. Como no máximo éramos quatro jogadores, essas expressões bastavam para
nós.
10) PULAR CARNIÇA
Acho que todos conhecem
essa brincadeira. Não era muito comum entre nós, mas eventualmente nos
divertíamos com ela.