O “post” de hoje é uma
bela pesquisa que o prezado Helio Ribeiro fez sobre o Hotel Villa Moreau. O “Saudades
do Rio’ agradece pela estupenda colaboração.
Na segunda metade do
século XIX, com a abertura da linha de bondes puxados ainda a burro para a
Tijuca (na época ainda chamada de Andarahy Pequeno), pela Companhia São
Cristóvão, alguns hotéis foram inaugurados nas proximidades da Usina. Um deles
foi o Hotel Villa Moreau. A história desse hotel é cheia de altos e baixos e há
muitas referências a ele nos jornais da época e ainda muitas após a sua
extinção. Marcou época.
A primeira citação ao hotel que consegui localizar consta do "Diário do Rio de Janeiro", edição de 29/04/1876, mostrada abaixo.
O hotel era de
propriedade de Alexis Jean Moreau, francês chegado ao Brasil antes de 1870.
Abaixo se vê uma foto do hotel, tirada por volta de 1887. Era cercado por densa
floresta, na encosta do Sumaré, cem metros acima do nível da rua. Imagino a
dificuldade de construir algo tão grande num lugar de tão difícil acesso.
A primeira propaganda
citando especificamente o hotel consta do "The Anglo-Brazilian
Times", datado de 08/02/1878. Não indica o endereço do hotel, porém diz
que era defronte à estação de bondes no Andarahy Pequeno.
Na edição de 29/08/1878
da publicação "O Cruzeiro" diz que o acesso para carros é pela Rua
Agostinho, ainda existente e que fica já quase chegando na Usina.
Num mapa da época essa
rua ia bem à frente do que vai hoje, chegando quase na altura da rua São
Rafael, conforme indicado no mapa abaixo, onde as setas indicam as ruas São
Rafael e Santa Carolina. Hoje em dia a rua Agostinho não daria acesso ao hotel,
se ele ainda existisse.
Na edição de 02/05/1884
da "Gazeta de Notícias" o hotel é anunciado para ser alugado, em
virtude de viagem do dono. As tratativas devem ser feitas no Hotel des Frères
Provençaux, fundado em 01/04/1856 pelos irmãos Guigou e que inicialmente se
situava na rua do Ouvidor, com entrada pela rua dos Latoeiros, 85. Em 1865 esta
rua mudou de nome para Gonçalves Dias e o número do hotel passou a ser 79.
Havia algum tipo de ligação entre esses dois hotéis, porque em vários anúncios
do Villa Moreau consta que seus hóspedes têm a opção de almoçar no Hotel des
Frères Provençaux e nos dias de correio para a Europa também podem jantar lá. E
vários anúncios dizem que maiores informações sobreo Villa Moreau podem ser
obtidas naquele Provençaux.
Eis que a 12/12/1885 o mesmo jornal posta um anúncio do antigo dono do hotel, Alexis Moreau, avisando que retornou da Europa e reassumiu a direção do estabelecimento. Na ausência do dono, o hotel foi gerenciado durante sete meses por um certo Felix Dupuy, que se suicidou em 1885 por motivos não ligados ao hotel. Nâo descobri qual foi esse período de sete meses.
Em 26/12/1885 no mesmo
jornal o senhor Moreau avisa que o hotel dispõe de um bonde (?) que leva os hóspedes
até o patamar do hotel, cem metros acima do nível da rua.
Em 20/05/1886 um
cozinheiro francês é contratado.
Em 26/05/1887, é
anunciada a entrada em testes do plano inclinado do hotel, movido a água.
Anúncios posteriores dizem que o percurso era feito em 3 minutos. A foto abaixo mostra um dos carros,
recentemente.
Em 16/06/1888 é novamente
anunciado o hotel para ser alugado.
Em 07/12/1889 é anunciada
a reabertura do hotel. Não consegui descobrir se ele havia sido vendido ou
alugado, mas o anúncio parece indicar que o dono ainda era o original.
Em 21/01/1890 o hotel é
posto à venda ou para aluguel, por moléstia do proprietário, que iria se
retirar para a Europa. O anúncio descreve em detalhes todo o complexo.
Por incrível que pareça,
no dia 08/11/1891 lá vem anúncio de nova reabertura do hotel, pelo mesmo senhor
Moreau. Dá para acreditar? O dono devia ter sete vidas! A reabertura está
prevista para o dia 01/12.
Em 03/04/1892 é postado
um anúncio com abaixo-assinado de nove hóspedes do hotel, negando terem
ocorrido mortes por febre amarela no estabelecimento. Os que assinam concordam
que houve sim casos da febre no hotel, mas todos os doentes se recuperaram,
tendo sido tratados na residência do proprietário do estabelecimento.
As ruas Santa Carolina e São Rafael são as últimas do lado direito da Conde de Bonfim antes de chegar ao Largo da Usina, denominado com esse nome somente a partir de 1898. O número 123 citado atualmente se situa na altura das atuais ruas Marquês de Valença e dos Araújos, no outro extremo da referida via, o que mostra que a numeração da Conde de Bonfim foi totalmente modificada. De acordo com os dados e da foto que constam na postagem, o antigo Hotel Moreau ficava no atual número 1305, onde funciona o Colégio Regina Coeli, e o plano inclinado se refere ao acesso ao Colégio. Fica junto aos Estúdios da Herbert Richers.
ResponderExcluirMinha mãe trabalhou no Regina Coeli por mais de 20 anos...há algum material no colégio referente ao hotel,como fotos e medalhas...vou ver com ela sobre esse material
ExcluirSensacional a pesquisa!!!!! Adoro pesquisar também. Nem cheguei ao final do romance franco-carioca e já estou elogiando. Não há rede social que substitua a seriedade de pesquisa e informalidade responsável do SdR. Lembro do Hotel Allen no Humaitá , que foi pesquisado e conta com amplo material. Parabéns ao pessoal. Volto a ler o texto .
ResponderExcluirNão custa lembrar que de acordo com o anúncio de 1890, os "bonds" que serviam o acesso a esse hotel não eram elétricos e a eletrificação desse trecho da Conde de Bonfim só ocorreu após 1907, conforme pode atestar o Hélio Ribeiro.
ResponderExcluirOlá, Dr. D'.
ResponderExcluirDia de aprender e acompanhar os comentários. Esperando a continuação.
Sobre as sucessivas reinaugurações o dono viajava para tratar da saúde, melhorava e voltava. Piorava, viajava e o ciclo recomeçava... O problema era não aparecer um candidato a comprador ou inquilino.
Bom Dia! Com A palavra os Tijucanos.
ResponderExcluirLi que no Villa Moreau foi construída "admirável piscina de natação, a mais importante da América do Sul, tão própria para os hóspedes, após a marcha de todo um dia, avigorar o corpo quebrantado."
ResponderExcluirOs eventuais moradores deveriam frequentá-la com todo respeito, porquanto severa advertência constava do letreiro à sua borda - É expressamente proibido tomar banho sem calça, no banho usar sabão, pós de dentres ou outros ingredientes."
É curioso observar que a língua francesa dominava o Rio do final do século 19. Outro anúncio dizia que "La Villa Moreau" posséde une Cascade Naturelle, une source d´eau ferrugineuse pour les anémiques".
ResponderExcluirAssim os anêmicos se beneficiariam desta fonte de água ferruginosa.
Outra curiosidade que achei foi que este hotel foi instalado inicialmente em Vila Isabel, transferindo-se em 1876 para a Serra da Tijuca.
ResponderExcluirE que já no início do século XX o hotel aceitava moradoras ali alojadas por admiradores (seria uma espécie de Mère Louise da Zona Norte?).
Atualmente a rua Conde de Bonfim começa no Largo da Segunda Feira na confluência das ruas Haddock Lobo e São Francisco Xavier, mas naquele tempo essa rua começava na altura da Rua Uruguai, pois até esse ponto a Conda de Bonfim tinha o nome de "Estrada do Andarahy Pequeno". Isso explica a baixa numeração que consta na postagem. Partindo-se dessa premissa os números 119, 121, e 123, "batem com os da postagem". E de acordo com um levantamento feito pelo Hélio Ribeiro, a estação terminal de bondes elétricos da "Estrada de Ferro da Tijuca" que funcionou entre 1898 e 1907 e que levava até o Alto da Boa Vista, ficava a 50 metros do início da "antiga Conde de Bonfim" na altura da esquina da atual Rua Dr. Otavio Kelly. Para não me estender mais, essa linha de bondes não transitava pela Conde de Bonfim e sim no trecho das então inexistentes Dr. Otavio Kelly, Pinto Guedes, e São Miguel, onde no final existia a Estação de geração de "força" {Usina} que deu nome ao local.
ResponderExcluirBela postagem que leva ao meu passado Rio e com muita saudade. Nos idos de 1957 minha família chegou ao Rio vindo do longínquo Ceará e nos alojamos em um apartamento na rua Santa Carolina, na Tijuca. Ainda sinto o cheiro no ar da Cia de Cigarros Souza Cruz que nos dias de fabricação de algum lote de cigarros inebriava o entorno com o delicioso aroma de fumo como também os barulhentos Bondes 66 Tijuca e o que subia até o Alto da Boa Vista. Meus primeiros registro nessa região foram o rio que cortava a rua a céu aberto cuja nascente vinha lá do alto da Serra da Tijuca. Minhas incursões pelas redondezas sempre me revelavam cenários muito diferentes do convivia lá no agreste Cearense. A rua Santa Carolina cruzava a São Miguel e não não tinha saída. O Colégio Regina Coeli ficava ou fica no alto do lado esquerdo da subida da Conde de Bonfim já bem perto da Usina. Não cheguei a conhecer esse Hotel que provavelmente em 1957 já não existia mais. Mas pelo que mostra as fotos sem duvida foi um excelente local para descanso totalmente diferente que existe hoje, pois a rua São Miguel, outrora bucólica e com belas mansões, hoje é área da comunidade carente do Morro do Borel. As excursões na região nos finais de semana sempre rendiam saborosas e perfumadas jacas, mangas e bananas. Que tempo gostoso...
ResponderExcluirBom dia a todos. Mais uma bela pesquisa do mestre Hélio, estarei acompanhando todo o seu desenrolar. Esta área nas proximidades da R. Agostinho fica o abandonado Carrefour, parece que empreendimentos franceses nesta região não tem vida longa.
ResponderExcluirDurante a pesquisa me chamou a atenção também a quantidade de firmas com nome francês e até mesmo anúncios em francês nos jornais, tanto de propaganda quanto de "precisa-se".
ResponderExcluirEu li um artigo bem recente em que o Villa Moreau era chamado de "o primeiro motel do Rio". Não sei se procede.
ResponderExcluirParabéns ao Hélio Ribeiro pelo ótimo trabalho de pesquisa. Os comentários também estão muito bons.
ResponderExcluirGostaria de saber detalhes sobre como a água movimentava o "bondinho". Seria a mesma técnica de movimentar rodas para acionar moendas, muito comum em antigas fazendas?
A instituição de ensino daquele trecho agora se chama Ecobé - Ciência com Vida, especializada em ecologia / meio ambiente. Numa olhada rápida em seu site não achei fotos das instalações prediais para comparar com a postagem de hoje. Nas fotos de satélite podemos ver alguns telhados mais antigos no meio de novos.
Baita pesquisa. Parabéns!
ResponderExcluirExcelente pesquisa. Parabéns ao autor
ResponderExcluirÓtima postagem, pesquisa de primeira. Parabéns!
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