O bonde 13, Ipanema, fez
parte da minha adolescência, pois era o bonde que pegava na Av. N.S. de
Copacabana, entre Dias da Rocha e Raimundo Correia, para ir até o Bar 20, em
Ipanema. O bonde chegou ao Bar 20, rodo na altura da Rua Henrique Dumont, em
1914.
Quase sempre tinha
reboque, onde me sentava. Ia pela contramão até a Francisco Sá, em direção à
Visconde de Pirajá. Esta, por volta dos anos 60, tinha poucas árvores, pouco
movimento e o calçamento era com paralelepípedos. Durante os muitos trajetos eu
observava o comércio de Ipanema.
Puxando pela memória me
lembro que logo no início da Visconde tínhamos no nº 29 a recém-inaugurada “La
Veronese”, que mantém a qualidade de suas massas até hoje. Do outro lado da rua
tínhamos “A Colegial”, visitada todo ano para aquisição do uniforme escolar. Quase
ao lado dela ficava o “Teatro Santa Rosa”. Chegando na Praça General Osório
havia o prédio da Companhia Telefônica, seguido do Colégio Fontainha, do
saudoso “Mercado Merpuga”, da loja “Formosinho”, do cinema “poeira” Ipanema,
com suas cadeiras de madeira, sem ar-condicionado, que passava dois filmes por
sessão e tinha filas enormes na Sexta-Feira Santa quando, todos os anos, exibia
“A vida de Cristo”. Logo depois a uma camisaria (seria a “Progresso”? Ou já
seria a “Sol de Ipanema”?), junto com o bar “Jangadeiro”.
Na esquina da Teixeira a
acanhada primeira loja do “Zona Sul”, do Mario, início de um império (Mario
havia começado com uma carrocinha de frutas na Praça General Osório. Antes era a
“Casa das Novidades”, de tecidos.
Entre a Teixeira de Melo
e a Farme de Amoedo proliferavam os bancos. Boavista, Real, Bamerindus,
Nacional, entre outros. No nº 135 a “Sapataria São Carlos”, ao lado o magazine “Duas
Américas”, onde hoje é a agência Ipanema da Caixa Econômica. Por ali funcionava
o “Colégio Polichinelo”, que depois foi o local da “Gardênia”, loja de tecidos.
No lado par havia as “Lojas Brasileiras”, a “Casa Osório”, uma grande
mercearia. Nesta quadra também a “Casa Mattos”, da família Salinas. No meio do
quarteirão ficava a “Confeitaria Pirajá”, enorme.
Na quadra entre a Farme
e a Montenegro lembro do “Frigorífico Nazareth”.
No quarteirão entre a
Montenegro e a Joana Angélica havia outro “poeira”, o Pirajá, que frequentei
muito. Programação parecida com a do Ipanema. Na esquina da Montenegro a “Casa
Futurista”. No lado ímpar também a Casa Oliveira, de comestíveis, e a “Sapataria
Sagaró”. No lado par a famosa “Casa Alberto”. Na esquina da Joana Angélica a
Padaria Ipanema, que resiste até hoje.
No quarteirão da Praça
N.S. da Paz havia a igreja, a Casa de N.S. da Paz onde funcionava uma clínica
médica, o Colégio São Francisco, o cinema Pax com sua escadaria de acesso, além
de um hotel para religiosos, tudo sob a batuta de Frei Leovigildo Balestiere (o
empreendedor que tempos depois ali criou uma fábrica de azulejos, um ringue de
patinação no gel, uma academia de ginástica, um boliche, além de ser pioneiro
na instalação de ar-condicionado na igreja).
Entre a Maria Quitéria e
Garcia D´Ávila me lembro da loja “Velha Bahia”, junto do prédio dos Correios.
Entre Garcia D´Ávila e
Anibal de Mendonça, no nº 477 ficava a ótima Padaria Eldorado, o melhor pão de
Ipanema. Perdeu o posto faz tempo. No nº 499 ficava o Bar Zeppelin. No outro
lado da rua, no nº 484, a “Sorveteria Morais”, onde íamos tomar sorvete na
saída do “Astória” ou do “Pax”.
Já no final da Visconde
de Pirajá ficava a “Casa Reis”, de material escolar, perto do Cinema Astória,
no nº 595. Era enorme. Depois o “Astória” virou “Super-Bruni-Ipanema” e, mais
adiante, abrigou os estúdios da “TV Excelsior”.Ao lado do “Astória” havia um
pequeno parque de diversões com brinquedos para a criançada. O melhor era uma
mini-cidade onde circulava um carrinho imitando um Ford, de uns 20cm de
comprimento, controlado pelo lado de fora da pista por um volante de tamanho
normal, com pedais de freio e acelerador, um marcha para frente e outro para
ré. O desafio era trafegar pela cidade sem colidir com nada e estacionar dentro
de uma garagem de uma casa. Acho que o tempo, por vez, era de 10 minutos. Para
quem ainda não tinha idade para dirigir, era formidável.
O bonde 13, na sua última viagem, foi parado na frente do Bar Zepellin por membros da Sociedade dos Amigos
do Bonde Ipanema, criada no Bar Zeppelin. Faziam parte deste grupo Millor
Fernandes, Paulo Mendes Campos, Aracy de Almeida, Lucio Rangel, Otelo Caçador,
Luiz Reis (o Cabeleira), Haroldo Barbosa (o Pangaré), Flávio de Aquino,
Edelweiss, Liliane, Willy Kelleer e outros.
Pouco depois das 22
horas lá vinha o bonde, balançando pela Rua Visconde de Pirajá quando a viagem
foi interrompida e o motorneiro Argemiro Cardoso dos Santos foi convidado para
um chope. Veio um fiscal da Light, mas foi subornado com uísque e chope gelado
e acabou aderindo à bagunça.
Como o número de ordem
do bonde era 1908, o pessoal aproveitou e jogou o número no bicho e deu 908 na
cabeça, grupo da águia, belo símbolo para uma lembrança eterna, que ficará
sobrevoando o bairro-poesia da Guanabara.
Na foto consegui
identificar à direita o Otelo Caçador, de branco a Aracy Almeida, atrás dela o
Haroldo Barbosa (o "Pangaré) e de roupa escura, ao lado do fiscal, o Luiz Reis (o "Cabeleira). Seria o
Lucio Rangel o de cabeça branca?
A lasanha da Veronese continua sendo para mima mais saborosa. Sobre a camisaria, o nome era Sol de Ipanema, e seu proprietário Antônio era casado com uma prima de meu avô.## Na linha 13 circulavam "Narragansets, Bataclans, também os do tipo Sossega leão". Isso ocorria também em outras linhas como a 68, mas nunca nas linhas 66, 75, 77, e 94. Não sei a razão dessa regra, mas certamente o Hélio deve ter conhecimento dela. Seria pelo volume de passageiros?
ResponderExcluirJoel : Na linha 85 - Cachambi não rodava Bataclã porque a curva do retorno era apertada.
ExcluirA linha 85 era mínima e certamente transportava pouca gente. Seu "rodo" era no local onde existe atualmente a loja "São Jorge de Cascadura". Realmente o local é muito apertado.
ExcluirBom dia! Delícia de crônica! Parabéns! Pena que o trafego da cidade (extremamente engarrafado esse dezembro) não comporte mais os simpáticos bondes. Comentários ao longo do dia. Millor Fernandes sempre na vanguarda da sensibilidade e sagacidade.
ResponderExcluirBom Dia ! Parece que a 13 era a linha de bonde mais famosa da Zona Sul. Vamos aguardar os comentários dos seus usuários.
ResponderExcluirOlá, Dr. D'.
ResponderExcluirQuem teve a sorte de pegar os bondes em sua época áurea foi privilegiado. Infelizmente só vivi a fase de Santa Teresa, completamente fora de mão para mim.
Agora, a 20 reais para não moradores, ficou ainda mais restrito. Em compensação, pode-se dizer, andei algumas vezes no VLT. Não é a mesma coisa mas "dá para enganar". Bonde, de perto mesmo, só no Centro Cultural da Light.
Ficarei acompanhando os comentários.
Das coisas que gosto, uma é entrar numa foto onde pouco se vê e atribuir peculiaridades. Pouca gente vai poder ir contra.
ResponderExcluirNa fotografia do mata-paulista, um indiscutível Citroën, de carioca, adentra o túnel, na mão segura. Enquanto isso, trilhando no trilho de ida, um carro escuro de rodas vermelhas, baixo o suficiente para poder ativar neurônios esportivos, incendeia a investigação. A roda aparece vermelha, mas está muito escura, seria uma roda raiada, sem interrogação. O que cabe aí? Um carro inglês, MGA, Jaguar? Ou algo mais raro?
Ahh.. se essa foto fosse maior, acabaria o prazer ao descobrir um Chevrolet de praça...
Quanto à mini-cidade com seu mini-Ford, era mesmo uma delícia e um desafio impossível era não atingir as áreas zebradas em cinza e amarelo que encerravam a brincadeira: Game Over!
ResponderExcluirEu conheci, e brinquei, na que ficava na sobreloja da galeria do Cinéac Trianon, ali na Rio Branco. Era do tempo em que o jacaré ainda estava no Largo da Carioca...
Como pude esquecer das áreas zebradas em cinza e amarelo? Era isto mesmo.
ExcluirUma viagem e tanto pela Ipanema do meu tempo. Que saudade do teatro Santa Rosa onde havia grandes peças de teatro e shows musicais como o do Simonal e Marly Tavares com o Bossa Três.
ResponderExcluirLuiz, vc certamente conheceu a excelente Padaria das Famílias, entre a Teixeira e a Farme, do “seu” Arnaldo.
Lembra da Casa Serra, um aviário na esquina da Farme?
Por ali tb não existia um bar famoso? Seria o Bar Americano?
Cesar, acho que assisti a este show do Simonal umas três vezes. Deve ter sido em 1964 ou 1965.
ExcluirNo dia 2 de Março de 1963, um dia após o fim da circulação de bondes em Ipanema e Copacabana, os Trolley-buses assumiram os respectivos espaços (leia-se trajetos). Os ônibus elétricos desde de sua implantação (Setembro de 1962) eram limitados em seu acesso à Copacabana pela Rua Inhangá, onde se situava um terminal provisório em razão da circulação de bondes em direção à Ipanema oriundos da Siqueira Campos estar ativa. Com o fim da circulação das linhas 12, 13, e 14, em 1°de Março de 1963, as linhas de ônibus elétricos puderam enfim seguir até Ipanema. Uma foto bem conhecida mostra a rua Visconde de Pirajá na altura da Praça General Osório com os Trolley-buses circulando na contra-mão.
ResponderExcluirUma verdadeira viagem no tempo! Também costumava andar no 13, que pegava no ponto da Francisco Sá entre N S de Copacabana e Raul Pompéia. Não havia ali por perto do Jangadeiros uma loja de brinquedos onde comprávamos nossas pranchas Oceania? Meu primo uma vez falou sobre um ferro-velho que existia na quadra da N S da Paz nos anos 50 na Visconde de Pirajá, mas não me lembro de ter visto.
ResponderExcluirNão tenho lembrança das linhas de bonde da Zona Sul. E mesmo da Zona Norte só lembro de uma viagem.
ResponderExcluirNo final de agosto passado andei passeando pela Visconde Pirajá, principalmente pelo entorno da Igreja N.S. da Paz, que visitei, incluindo a média com pão e manteiga na Padaria Ipanema.
Interessante que só esse mês assisti o filme sobre o Pixinguinha, com Seu Jorge, e confesso que não sabia da morte do maestro dentro da citada igreja. Estou pensando em adquirir a biografia para mais detalhes.
Do "game" da mini cidade com o carro de 20cm lembro de ter visto um em frente à Praça do Pacificador em Caxias, lá pelo final dos anos 60. Parecia tão velho que pode ser o mesmo de Ipanema, depois de desalojado da Visconde de Pirajá.
Joel, 07:23h ==> a linha 66 - Tijuca era a que transportava a maior quantidade de passageiros. Por isso os bondes eram sempre grandes (bataclãs ou sossega-leão). As linhas citadas por você, ou seja a 75 - Lins de Vasconcellos, 77 - Piedade e 94 - Penha x Largo de São Francisco, também só usavam bondes grandes. A 93 - Penha x Praça Mauá tanto podia usar bondes grandes como carro-motor grande com reboque pequeno.
ResponderExcluirFico impressionado com a memória do Luiz. Chose de loc!
ResponderExcluirA linha 13 podia se apresentar com letreiros diferentes: podia ser IPANEMA, ou IPANEMA - TÚNEL DO LEME, ou IPANEMA - TÚNEL C. CINTRA. Desta última é muito difícil obter fotos. Só tenho uma. Das demais, tenho várias.
ResponderExcluirTambém me lembro daquele famoso Ford, se não me engano modelo 1951, que havia em alguns parques de diversão. Cheguei a "dirigir" uma ou duas vezes o dito cujo. Muito legal.
ResponderExcluirNo dia da última viagem do Ipanema, o jogo do bicho dar a mesma centena que a do bonde? Isso me cheira a mutreta. Como dizem os chineses, coincidências não existem.
ResponderExcluirOu licença poética do Ruy Castro em "Ela é carioca".
ExcluirMinha presença em Ipanema era constante entre 1970 e 1989, período em que os bondes não mais circulavam. Lembro bem dos estabelecimentos que ocuparam o n°22 da Visconde de Pirajá: o "Preto 22, a New York City discotheque, e o Carinhoso, dos quais eu frequentei os dois últimos. Também fui algumas vezes ao "Privé" na Praça General Osório, onde existe atualmente o restaurante Fazendola.
ResponderExcluirNa canção "Rio Antigo", cantada magistralmente pela "marrom" Alcione, a letra faz menção ao bonde 12 de Ipanema e não o 13. Esse 12 era o que ia para o centro, suponho...
ResponderExcluirWagner, durante uma época o 13 ia pelo Túnel Novo e o 12 pelo Túnel Velho, pelo que me lembre.
ExcluirAmbos iam até o Tabuleiro da Baiana.
ResponderExcluirEm Teresópolis perto da Praça Santa Tereza também tinha o desafio de parar o carro na garagem, parada obrigatória em todos os fim de semana que ia pra lá. O difícil era não bater no fundo da garagem, já que não dava pra ver dentro dela. Depois de muita prática quando finalmente consegui parar o carro lembro que me perguntei, e agora? Naquele tempo também adorava ir no auto-pista (carro de batida) no parque de diversões.
ResponderExcluirA primeira vez que dirigi um carro de verdade foi aos 10 anos em uma estrada de barro, no bairro Independência em Petropolis, adorei! Depois disso a diversão era dirigir o carro, aos 14 anos já sabia dirigir muito bem. Foi uma longa e frustrante espera até poder dirigir legalmente, de vez em quando dava uma roubadinha e ia dar um rolé, uma vez meu pai soube e ameaçou que ia chamar a polícia e me botar no SAM.
Beatriz
ResponderExcluirWagner Bahia, 16:21h ==> prezado, o bonde linha 12 também era Ipanema, porém via Túnel Velho. Ele e o 13 partiam do Tabuleiro da Baiana e faziam o mesmo trajeto até a esquina das ruas da Passagem e General Polidoro. O 13 ia em frente, entrava na Góis Monteiro, Lauro Sodré, atravessava o Túnel Novo, entrava na Nossa Senhora de Copacabana. Já o 12 entrava na General Polidoro, Real Grandeza, Túnel Velho, Siqueira Campos. Aí entrava na Nossa Senhora de Copacabana e seguia o mesmo trajeto do 13 até o final da linha.
ResponderExcluir