Relembramos hoje dois
personagens famosos do “Saudades do Rio”. Os infatigáveis Lulu & Dudu que
tanto contribuíram para o desenvolvimento do Rio.
Para homenageá-lo, segue crônica
de Machado de Assis:
(...) De repente ouvi
vozes extranhas; pareceu-me que eram os burros que conversavam, inclinei-me (ia
no banco da frente do bond); eram elles mesmos. Como eu conheço um pouco a
lingua dos Houyhuhums, pelo que d´ella conta o famoso Gulliver, não me foi
difficil apanhar o dialogo.
Bem sei que cavallo não é
burro; mas reconheci que a lingua era a mesma. O burro falla menos, de certo;
é, talvez, o trapista d´aquella grande divisão animal, mas falla.
Fiquei inclinado e
escutei: Tens e não tens razão, respondia o da direita ao da esquerda. O da
esquerda: Desde que a tracção electrica se estenda a todos os bonds, estamos
livres, parece claro. Claro, parece, mas entre parecer e ser, a differença é
grande. Tu não conheces a historia da nossa especie, collega; ignoras a vida
dos burros desde o começo do mundo.
Tu nem reflectes que,
tendo o salvador dos homens nascido entre nós, honrando a nossa humildade com a
sua, nem no dia de Natal escapamos da pancadaria christan. Quem nos poupa no
dia, vinga-se no dia seguinte. Que tem isso com a liberdade?
Vejo, redarguiu
melancholicamente o burro da direita, vejo que há muito de homem n´essa cabeça.
Como assim? bradou o burro da esquerda, estacando o passo. O cocheiro, entre
dous cochilos, juntou as redeas e golpeou a parelha.
Sentiste o golpe?
pergunto o animal da direita. Fica sabendo que vieram com a regra de se não
empregar o chicote. Espanto universal dos cocheiros: onde é que se viu burro
andar sem chicote? Todos os burros d´esse tempo entoaram canticos de alegria e
abençoaram a idéa dos trilhos, sobre os quaes os carros deslisariam
naturalmente. Não conheciam o homem. Sim, o homem imaginou um chicote, juntando
as duas pontas das rédeas.
Sei também que, em certos
casos, usa um galho de arvore, ou uma vara de marmelleiro. Justamente. Até acho
razão ao homem. Burro magro não tem força; mas, levando pancada, puxa. Sabes o
que a directoria mandou dizer ao antigo gerente Shannon? Mandou isto:
"Engorde os burros, dê-lhes de comer, muito capim, muito feno, traga-os
fartos, para que elles se affeiçoem ao serviço; opportunamente mudaremos de
politica, all right".
D´isso não me queixo eu.
Sou de poucos comeres; e quando menos trabalho, é quando estou repleto. Mas que
tem capim com a nossa liberdade, depois do bond electrico? O bond electrico
apenas nos fará mudar de senhor. De que modo? Nós somos bens da companhia.
Quando tudo andar por arames, não somos já precisos, vendem-nos. Passamos
naturalmente ás carroças.
Pela burra de Balaam!
Esclamou o burro da esquerda. Nenhuma aposentadoria? Nenhum premio? Nenhum
sinal de gratificação? Oh! Mas onde está a justiça d´este mundo?
Passaremos ás carroças,
continuou o outro pacificamente, onde a nossa vida será um pouco melhor; não que
nos falte pancada, mas o dono de um só burro sabem mais o que elle lhe custou.
Um dia, a velhice, a lazeira, qualquer cousa que nos torne incapaz,
restituir-nos-há a liberdade...
Enfim! Ficaremos soltos,
na rua, por pouco tempo, arrancando alguma herva que ahi deixem crescer para
recreio da vista. Mas que valem duas dentadas de herva, que nem sempre é
viçosa! Enfraqueceremos; a edade ou a lazeira ir-nos-há matando, até que, para usar
esta metaphora humana, esticaremos a canella. Então teremos a liberdade de
apodrecer. Ao fim de trez dias, a vizinhança começa a notar que o burro cheira
mal; conversação e queixumes. No quarto dia, um vizinho mais atrevido, corre
aos jornaes, conta o facto e pede uma reclamação. No quinto dia sahe a
reclamação impressa. No sexto dia, apparece um agente, verifica a exactidão da
noticia; no septimo, chega uma carroça, puxada por outro burro e leva o
cadaver.
Seguiu-se uma pausa. Tu
és lugubre, disse o burro da esquerda. Não conheces a lingua da esperança. Póde
ser, meu collega; mas a esperança é propria das especies fracas, como o homem e
o gafanhoto; o burro distingue-se pela fortaleza. A nossa raça é essencialmente
philosophica. Ao homem que anda sobre dous pés, e provavelmente a aguia, que
vôa alto, cabe a sciencia da astronomia. Nós nunca seremos astronomos; mas a
philosophia é nossa. Todas as tentativas humanas a este respeito são perfeitas
chimemanas.
Cada seculo...O freio
cortou a phrase ao burro, porque o cocheiro encurtou as rédeas, e travou o
carro. Tinhamos chegado ao ponto terminal. Desci e fui mirar os dous
interlocutores. Não podea crer que fossem elles mesmos. Entretanto, o cocheiro
e o conductor cuidaram de desatrelar a parelha para leval-a ao outro lado do
carro; aproveitei a occasião e murmurei baixinho, entre os dous burros: Houyhuhums! Foi um choque
electrico. Ambos deram um estremeção, levantaram as patas e perguntaram-me
cheios de enthusiasmo: Que homem és tu, que sabes a nossa lingua? Mas o
cocheiro, dando-lhe de rijo uma lambada, bradou para mim, que lhe não
espantasse os animaes. Parece que a lambada devera ser em mim, se era eu que
espantava os animaes; mas como dizia o burro da esquerda, ainda agora: Onde
está a justiça d´este mundo?
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Na última foto, as carroças concentram-se na Praça dos Estivadores, junto a Rua Camerino, no Centro.
ResponderExcluirBom dia, Dr. D'.
ResponderExcluirCheguei mais cedo, antes do gerente. Agora, o estabelecimento, de utilidade pública, está aberto.
Lulu & Dudu são parte importante da história da cidade, seja "individualmente" ou em dupla.
Ah, uma coisa que me diverte são textos escritos em uma grafia antiga e com termos desconhecidos para 95% dos brasileiros. Até 1942 se escrevia dessa forma e apenas quem nasceu no antigo Distrito Federal possui condições de entender e compreender expressões largamente empregadas em passado não tão remoto...
ResponderExcluirBom Dia ! Acabei de assistir palestra do Dr Antony Wong, Infectologista.Pediatra e Toxicologista,Diretor do CEATOX do HC de São Paulo. Afirma ele que no máximo que o corona vírus pode causar é um resfriadinho de baixíssima letalidade. Segundo sua fala, no final de Abril termina o "surto" do resfriado mais inofensivo da história.Diz ele ainda que o "influenza" este ano vai fazer muitas vítimas, e que autoridade nenhuma está se preocupando com isso. Tudo que vemos são aqueles que vivem na mamata do Estado,espalhando o terror, proibindo até o direito de trabalhar. Nitidamente se observa que o interesse maior desses "protetores" é proteger sim , as suas gordas verbas. Japão,Austrália,israel,Holanda e suécia não tem isolamento.Claro que não podemos comparar os políticos de lá com os de cá.
ResponderExcluirInfelizmente a maior parte do acima descrito não está correto. Vários dos países citados viram o erro cometido e voltaram atrás. Os milhares de mortos na Espanha e na Itália, num curtíssimo espaço de tempo, bem demonstram o erro da estratégia adotada. Mas não ainda discutir. Hoje em dia todos têm certezas sobre todos os assuntos e são surdos aos argumentos. Estou com o ministro Mandetta: acompanho o que a Ciência vem dizendo. E tomo minhas preucações.
ExcluirTenho esperança que as coisas tomem o rumo que a maioria dos Brasileiros espera. Caso contrário, seremos todos nós transformados em Dudu & Lulu, com direito a chicotadas para quem reclamar.
ExcluirMauro, guardadas as devidas proporções, Dória acredita que está vivendo em 1932 e cooptou um outro inconsequente para uma aventura que pode ter um fim trágico. Do "Estado de emergência" para o "Estado de defesa" é apenas "um sopro". Não dúvidas que algo sério está por vir.
ExcluirUma boa parte já está transformada em Dudu & Lulu. São aqueles que não conseguem ver a realidade a sua volta apesar de todos os esclarecimentos médicos e científicos.
ExcluirRealmente é de fazer pensar. Mas contava o sumido Comandante JBandeira, que a dupla Lulu & Dudu conseguem levar uma vida razoável após a aposentadoria.
ResponderExcluirAno passado mesmo acabaram com as charretes de turismo em Petrópolis. Qual foi o destino dos cavalos?
Li uma vez que em Nova Iorque eram tantos equinos até o início do século 20, que se livrar dos restos mortais deles era um dos grandes problemas da cidade.
Já em terras do Ceará e adjacências a motocicleta tirou o emprego de muitos moares nas últimas décadas.
Os trilhos foram o maior avanço do transporte público e de cargas do século 19, de bonde ou de trem.
O Anônimo está correto em um ponto no comentário das 11 Hs: "Todos tem certeza em todos os assuntos". Resumindo: Sabedoria, ativismo, e ignorância, andam na mesma cadência e somente os fatos concretos darão a palavra final. "In quod verun".
ResponderExcluirO JBAN jurava que ambos,Lulu e Dudu,recebiam o teto máximo da previdência...Com justiça!!!!
ResponderExcluirO jornal "Corriere della Sera" da Itália todo dia publica uma tabela completa sobre os casos do coronavírus daquele país, o que não vejo por aqui. Ou seja, não é só número de infectados (total 115 mil pessoas) e mortos (quase 14 mil).
ResponderExcluirPara quem raciocina só em termos econômicos:
Os internados (28 mil pessoas); em terapia intensiva (4 mil); isolamento domiciliar (50 mil) e curados (quase 19 mil) são muitos.
Além dos custos com medicamentos, das equipes de atendimentos (de médicos e enfermeiros até o pessoal da limpeza), inclusive seus EPI's e outros equipamentos.
Mais de 80 mil doentes fora de circulação ao mesmo tempo e outros 19 mil que já estiveram sem poder produzir, prestar serviços, vender e/ou contratar, comprar/consumir.
Agora é só fazer uma regra de três com as populações daqui e de lá e pode dar um desconto de 10% para menos no Brasil.
Mesmo ignorando friamente a mortalidade, um Paulo Guedes da vida sabe fazer a conta do impacto de 14 dias ou mais de licença médica dos infectados sobreviventes. Tanto que o ministro da economia "sentiu o golpe", como se diz na linguagem do boxe, e ficou macambúzio por uns dias, por concluir que seus sonhos neo-liberais estão adiados sem data pois tem que abrir o cofre para o dinheiro voltar a circular.
Sabe que com pandemia na área dele "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come", mas na saúde, quem correr para dentro de casa tem chance de nem ficar doente junto com vários outros ao mesmo tempo.
Quanto aos que compram não há garantia de que tantos assim vão do isolamento neste momento, para consumir e tocar a roda da economia.
O certo é: "...tantos assim vão sair do isolamento..."
ExcluirQuem não é da medicina ou principalmente não é sanitarista, infectologista, biólogo ou cientista dessas áreas, tem que se basear no que dizem esses profissionais sobre o novo coronavírus.
ResponderExcluirTodos os leigos são ignorantes no assunto, inclusive eu, e só podem falar baseados nas opiniões e dados técnicos fornecidos pelos especialistas, que em larga maioria, até a data de hoje, indica o isolamento social.
Esse pessoal ganha ainda mais dinheiro e prestígio social.
Excluirem 100 anos é a primeira "pandemia" que aparece. Por que não apareceu antes?
E qual é o histórico?
ResponderExcluirQuantos anos entre uma pandemia e outra, ao longo da história da humanidade?
Não há, mas pode ter certeza que vai entrar para o calendário de eventos mundiais.
ExcluirFF: Segundo notícias que estão circulando em Brasília, parece que Braga Neto é o "Presidente operacional do Brasil". O objetivo é "proteger Bolsonaro". As notícias ainda são vagas e algo grave está acontecendo.
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